Reset
Ontem, eu toquei o limiar do silêncio absoluto, aquele em que tudo cessa e o caos parece finalmente render-se à quietude. Fui parar no hospital, onde, por breves segundos, deixei de ser. Meu corpo, por um instante, desistiu de si, e naquele vazio, não houve dor, nem medo, nem a pressão esmagadora que tantas vezes me sufoca. Foi como um reset, um desligar de um mecanismo que há muito vinha sendo corroído pelo desgaste das lutas diárias.
Eu sei, e talvez você saiba também, que há momentos em que parece que tudo ao nosso redor conspira contra o nosso bem-estar. Não porque não somos felizes, mas porque insistem em nos empurrar para o abismo. Há quem faça disso um desporto — atacar-nos onde somos mais frágeis, inventar mentiras sobre o que nunca fizemos, manchar nossa reputação com veneno destilado em palavras afiadas. E pior, fazem isso de forma sistemática, uma gota incessante de tortura que vai erodindo nossa essência.
Há uma dor peculiar em ser desumanizada, reduzida a sombras do que somos de facto. Sentimos o peso de olhares de julgamento, de dedos apontados, de sussurros que reverberam falsidades. E nos perguntamos: como escapar? Como fugir desse ciclo interminável de agressões, de expectativas desmedidas e de cobranças que, francamente, ninguém deveria suportar?
Ontem, por um breve instante, eu pensei que a resposta estava ali, no vazio, naquela paz tão inesperada. Quando tudo parou, parecia haver uma beleza quase transcendental em estar ausente de mim mesma, sem a constante guerra interna e externa. E eu entendi, por um momento, porque alguns escolhem essa pausa definitiva, porque ela pode parecer um refúgio.
Mas a verdade é que eu não estou pronta para esse fim. Não ainda. No limiar, lembrei-me dos meus filhos, dos olhares que me amam, daqueles que me seguram quando estou prestes a cair. Lembrei-me que, apesar de tudo o que me fazem, eu tenho amor, e esse amor, sustenta-me, vale a luta.
Fazer reset, para mim, não foi desistir. Foi um grito silencioso de que algo precisava mudar. Não posso, e não vou, permitir que os ataques me definam, que as mentiras me rebaixem. Se há uma coisa que aprendi nesses momentos entre a vida e a ausência dela, é que eu sou mais do que as opiniões dos outros. Sou mais do que a dor que me infligem.
E então, voltei. Voltei porque, apesar de tudo, ainda há muito por viver.