Hoje
Hoje foi um daqueles dias que nos obrigam a parar e refletir sobre como estamos a ensinar os nossos filhos a lidar com os próprios sentimentos. A reunião acabou mais tarde do que eu esperava, e, para aproveitar o tempo, fomos todos brincar para o parque. O ambiente estava animado, as crianças corriam, molhavam-se e riam, até que a colega do meu filho lhe fez uma pergunta sobre o passado. A resposta dele desencadeou uma conversa que eu sabia ser necessária, uma daquelas que nos ensina mais sobre a forma como processamos as nossas emoções.
Percebi, naquele momento, que seria importante explicar ao meu filho que não há problema algum em sentir e, mais ainda, em admitir o que se sente. Ensinar-lhe a dar nome aos seus sentimentos é parte fundamental do crescimento emocional. É o primeiro passo para arrumar tudo, colocando cada emoção no seu devido lugar. Não há nada de errado em falar sobre o que se sente; pelo contrário, é essencial. Expressar o que nos vai na alma ajuda-nos a processar o que vivemos, especialmente quando se trata de experiências difíceis ou confusas.
Conforme fomos conversando, ele disse-me que não se lembrava muito bem da pessoa sobre a qual a colega tinha perguntado, mas recordava-se da amizade que tinha tido com ela. Foi então que ele me perguntou, num tom cheio de curiosidade e alguma tristeza, se essa pessoa ainda se lembraria dele. Com calma, respondi que sim, que o que ele estava a sentir era perfeitamente normal. A vida é feita de memórias e, quando os sentimentos são sinceros, as pessoas de quem gostámos deixam uma marca, mesmo que o tempo passe. Expliquei-lhe que é natural que, às vezes, sintamos mágoa ao lembrar alguém com quem já tivemos uma ligação especial, mas que isso não apaga os momentos bons.
Foi nesse instante que ele desabou em lágrimas. Entre soluços, contou-me que, para além da amizade, só se lembrava de uma vez em que tinha comido um bolo de chocolate num sítio que eu prefiro não mencionar. Fiquei ali, ao seu lado, a ouvir atentamente, sem julgar, sem apressar a conversa. O choro dele não era de dor profunda, mas de uma mistura de nostalgia, magoa, tristeza e confusão, e eu sabia que era fundamental deixar que ele expressasse tudo. É assim que aprendemos a gerir os nossos sentimentos: primeiro sentindo-os, depois falando sobre eles.
Disse-lhe então, com toda a serenidade que pude encontrar, que o que estava a sentir era natural. A vida é mesmo assim. Pessoas entram e saem das nossas vidas, algumas deixam memórias mais fortes que outras, mas o importante é que o tempo que passamos com elas e as emoções que partilhamos são reais, e é isso que importa. Falei-lhe que as recordações de amizade, por mais simples que possam parecer — como a de um bolo de chocolate —, são preciosas. E o facto de ele ainda se lembrar disso mostra o quão importante essa pessoa foi para ele, o perdão deve estar sempre presente e devemos guardar as boas memórias.
A cada dia que passa, tento ensinar-lhe que os sentimentos não devem ser evitados ou reprimidos. Nomear o que sentimos ajuda-nos a compreender, a organizar internamente as experiências e, mais importante, a crescer. Hoje foi um desses dias em que vi, de forma clara, o valor de lhe ensinar a falar sobre os seus sentimentos. Não é uma tarefa fácil, e nem sempre tenho as respostas certas, mas quero que ele saiba que não há vergonha em sentir tristeza, nostalgia, ou até mágoa. É tudo parte do que significa ser humano.
No final, dei-lhe um abraço e senti que a conversa o acalmou. Saber que podia falar sobre o que sentia, que os seus sentimentos eram validados, e que havia espaço para processar tudo isso ao seu ritmo, pareceu-lhe dar uma sensação de alívio. É este o meu papel como mãe estar presente, ouvir, e ajudá-lo a navegar pelo mundo complexo das emoções, para que, no futuro, ele possa fazer o mesmo sozinho. E, ao longo do caminho, também eu aprendo, porque gerir os sentimentos é uma jornada contínua, para todos nós. Os coleguinhas também ouviram com atenção e todos abraçamos o meu filho para que saiba que admiramos o ato de coragem em falar abertamente sobre sentimentos e emoções, finalmente se abriu. Graças a Deus.