Bênção Sem Engano

 09-03-2025.


Ontem explicava a uma amiga o que é que mudou em mim e o que continua a mudar.

A transformação que vivi não foi como um toque de varinha mágica. Não foi um “clic” que apagou tudo o que era em mim e substituiu por algo novo, algo perfeito. Não. O que mudou em mim foi mais subtil, mais doloroso, mais verdadeiro. Foi um processo — um processo que se alimenta de morte e de renascimento. E, talvez, por isso mesmo, seja tão difícil de expressar. Tentei traduzir tudo aquilo em palavras, mas as palavras fogem. Tudo o que posso dizer é: Deus não me deu uma vida nova. Deus fez de mim uma nova vida.

Eu vou à Igreja, sim. E vou porque ali encontrei algo que o mundo não pode dar. Vou à Igreja não para pedir favores, não para obter favores terrenos, mas porque ali encontrei uma fé que me força a morrer para mim mesma, para que possa verdadeiramente nascer para algo que não sou capaz de gerar por mim mesma. Não vou em busca de sucesso, de segurança, ou de garantias de que a minha vida vai ser fácil. Não vou para fazer pedidos ao Deus utilitário que tantos esperam encontrar, mas sim para me entregar a um Deus que exige tudo de mim.

E, no entanto, não posso deixar de reparar no engano que tanto permeia a religiosidade moderna. Muitos entram nas igrejas à procura de algo para satisfazer as suas vontades. E é aí que reside a falácia. Deus não serve aos nossos desejos. Deus não está aqui para oferecer o que pedimos, mas para nos mostrar o que precisamos. Não é uma questão de pedir e receber, de barganhar favores. É uma questão de aprender a viver à luz de uma verdade muito mais profunda: as bênçãos de Deus não são terra, não são moedas, não são amores que se compram com orações. As bênçãos de Deus são o que Ele faz dentro de nós.

O que Deus oferece não é o que se vê. Ele não distribui fortuna, não oferece cargos, não dá amor como troca. Ele oferece mudança. Ele oferece interioridade. Deus faz de nós o que somos, e não o que o mundo diz que devemos ser.

Agora, talvez alguém me pergunte: "Mas, eu comprei um carro muito bom. Isso não foi uma bênção de Deus?" Não. Deus não te deu o carro. Deus não te dá bens materiais, não te dá o emprego, não te dá o amor. Deus não manipula a tua vida para te entregar o que desejas. Ele oferece-te algo muito mais valioso: Ele dá-te sabedoria para alcançar o que precisas, força para trabalhar por aquilo que desejas e, acima de tudo, discernimento para saber que o que tens, não é teu — é um presente que deve ser usado para o bem, e não um símbolo de status ou conquista.

Quando agradecemos a Deus por algo material, por uma conquista ou uma posse, devemos ter cuidado com a forma como vemos isso. Não devemos cair na tentação de atribuir a Ele as vitórias do nosso esforço pessoal, como se Ele fosse um geniozinho que nos dá tudo o que pedimos. A verdade é que o carro que compraste, o emprego que tens, o amor que encontras, são frutos das tuas escolhas, das tuas atitudes, da tua perseverança e trabalho. Deus não está em cada transação material, mas está, sim, no coração que se entrega a Ele e na transformação que Ele opera dentro de ti.

Quando a sociedade diz que as bênçãos de Deus se traduzem em bens materiais, está a enganar-se e, pior ainda, a enganar aqueles que buscam a verdade. Deus não é uma máquina de favores. Não se compra nada de Deus com orações ou com a presença na igreja. O que Ele dá é o que não se pode ver: é a transformação do coração, a abertura para o amor, a humildade para aceitar que nem tudo está no nosso controle.

É um erro grave achar que Deus está a abençoar as nossas conquistas materiais. Ele pode estar a abençoar a nossa perseverança, a nossa humildade, o nosso trabalho. Ele pode estar a abençoar o nosso esforço para ser melhores, para fazer o bem, para viver com mais fé. Mas, um carro, um emprego, uma casa não são as bênçãos de Deus. São o reflexo das escolhas que fazemos, do esforço que colocamos, da perseverança que temos.

Por isso, se alguém te disser que as bênçãos de Deus se medem pelo que conquistamos aqui, no plano material, acorda. O que Deus oferece é mais profundo, é mais invisível, é para o interior, não para as aparências. As verdadeiras bênçãos de Deus não estão nas coisas que possuímos, mas na transformação que Ele realiza em nós, nas atitudes que tomamos, no modo como lidamos com os outros, nas pequenas escolhas diárias que nos aproximam mais Dele.

E é por isso que, se alguém diz que vai à igreja e de repente consegue o emprego dos sonhos ou encontra o amor da sua vida, esse testemunho é superficial. Não é a verdadeira bênção de Deus. Deus não nos faz felizes no sentido material. Ele nos faz íntegros. Ele nos faz humanos. E a verdadeira felicidade nasce de ser humano. De reconhecer que somos falíveis, que erramos, que somos pequenos, mas que, mesmo assim, podemos nos levantar e fazer a diferença.

Quem vai à igreja à procura de algo tangível não compreendeu o que é a verdadeira bênção. E quem diz que encontrou isso na igreja, provavelmente ainda está à procura de algo que, no fim das contas, nem sequer se compara àquilo que Deus nos dá. Porque o que Ele dá não é para o ego. Não é para a vaidade. É para o coração. E o coração só pode receber essa bênção quando está vazio de si mesmo e pronto para ser preenchido com a sua infinita misericórdia.

Deus não nos dá respostas fáceis. Ele nos dá a capacidade de lidar com as perguntas difíceis. Ele não nos promete uma vida sem desafios. Ele nos oferece a sabedoria para enfrentá-los, e a graça para não sucumbir ao medo. Ele não nos dá riqueza, mas dá-nos uma alma rica de virtude. Ele não nos dá fama, mas dá-nos a dignidade. Ele não nos dá conforto, mas nos dá força. Ele não nos dá um caminho plano e sem pedras, mas dá-nos pés fortes para caminhar.

E assim, quem vai à igreja com o desejo de melhorar as circunstâncias da sua vida material não vai de coração. As bênçãos de Deus são do coração. Elas não são manifestações externas. Elas são visíveis nas atitudes, nos gestos, nas escolhas diárias de como lidamos com o outro, de como perdoamos, de como amamos. Elas estão na maneira como tratamos o mundo que nos rodeia, não no que conseguimos conquistar dele.

Deus não está na nossa capacidade de ter ou de possuir. Está na nossa capacidade de ser. De ser quem Ele quer que sejamos — amáveis, misericordiosos, humildes, puros de coração. O que Ele dá a cada um de nós não são objetos ou status, mas o poder de ser melhor. O poder de transformar a própria vida, não através de riqueza material, mas de virtudes imortais.

Por isso, sempre que alguém subir ao púlpito e falar de "bênçãos materiais", de “prosperidade” como recompensa divina, é preciso ouvir com cuidado. Porque Deus não manipula as nossas vidas para que possamos ter mais do que o mundo oferece. Ele trabalha nas nossas almas para que possamos dar mais aos outros. As bênçãos de Deus são para o coração, e o coração só se purifica quando é vazio de si mesmo e cheio de amor pelo outro.

E é nisso que se revela a verdadeira riqueza. Uma riqueza que não se mede em ouro, mas em transformação. Uma riqueza que só existe quando nos entregamos de verdade, sem esperar nada em troca. Quando nos tornamos, enfim, aquilo para o qual fomos chamados: imagens de Deus, portadores do Seu amor.

Mas isso não quer dizer que a nossa essência humana tenha de ser apagada. Deus não nos pede que sejamos seres sem alegria, sem personalidade, sem espontaneidade. Não quer que abdicamos da nossa humanidade, mas sim que a elevemos à Sua luz. O que Ele quer, de facto, é que as virtudes que Ele nos oferece — a generosidade, a paciência, a misericórdia, a humildade — se desenvolvam em nós, ao mesmo tempo que os nossos defeitos e limitações sejam, pelo menos, controlados.

Sim, continuamos a rir, a beber, a dançar, a festejar. Deus não nos pede para nos afastarmos da vida, mas para vivê-la de forma plena, autêntica, sem medos ou máscaras. Se quiseres usar uma mini-saia, um decote, e o coração estiver alinhado com o que é bom e verdadeiro, então essa expressão do teu ser é apenas um reflexo da tua liberdade em Cristo, na medida certa, sem excluir ninguém. Não é sobre como nos vestimos, mas sobre como nos mostramos ao mundo — com respeito, com alegria, com amor. Não se trata de negar a nossa humanidade, mas de transcender as limitações que a nossa humanidade impõe.

Nós, como humanos, não somos perfeitos, mas podemos escolher diariamente o caminho da virtude. E isso, sim, é a maior bênção que podemos receber de Deus: o poder de desenvolver aquilo que há de melhor em nós, sem deixar que as nossas imperfeições nos definam, mas nos ensinem.

Porque a verdadeira essência não é o que fazemos ou deixamos de fazer — é como o fazemos e com que intenção. E é aí, nesse espaço sagrado entre as escolhas que fazemos, que se revela a verdadeira transformação de Deus. Por isto tudo digo com orgulho Deus queira que eu siga sempre Teus caminhos a ti entrego minhas dores, minhas vitórias e meu dia. 

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