Falsa piedade.
Dizem-me, com um ar de falsa piedade: "Estás a envelhecer. Tornaste-te fria, distante, talvez até amarga." Eu sorrio, não por condescendência, mas porque finalmente compreendo algo que demorou anos a ser desvendado. Não, não estou a envelhecer – estou a despertar. Estou a despojar-me de máscaras, de pesos e de expectativas que nunca foram minhas. Estou, pela primeira vez, a ser verdadeiramente eu.
Passei tanto tempo a construir castelos em terrenos que não escolhi, a investir energias em relações que nunca me abraçaram por inteiro. Vivi demasiado tempo à sombra de reflexos criados por outros, tentando corresponder a ideais que não reconheço como meus. Agora, olho para o espelho – o verdadeiro, aquele que não mente – e vejo-me, nua de artifícios, plena na minha essência.
Sim, houve perdas pelo caminho. Deixei para trás pessoas, crenças e hábitos que já não me pertenciam. Não por rancor, mas por respeito a mim mesma. Porque crescer é isso – é perceber que nem tudo o que carregamos tem de nos acompanhar para sempre. Há uma doçura infinita na leveza de quem solta as amarras, na sabedoria de quem escolhe o que vale a pena guardar no coração.
Dizem que me tornei exigente. Talvez. Mas não por frieza – por clareza. Aprendi a distinguir entre o essencial e o supérfluo, entre o que me eleva e o que me pesa. Não tenho tempo para diálogos vazios, para ideologias ocas, para lugares que não acrescentam cor à minha jornada. A minha vida é agora um jardim onde só cultivo o que floresce em mim.
Não, não me tornei amarga. Tornei-me seletiva. E há uma diferença enorme. Rejeitar o que nos fere ou limita não é um ato de rejeição ao mundo, mas um gesto de amor-próprio. Quem me vê de fora talvez confunda esta força com solidão. Mas quem mergulha na verdade sabe que há uma vastidão de paz em aprender a bastar-me.
O que eles chamam de velhice, eu chamo de despertar. O que dizem ser o declínio, eu reconheço como a ascensão à minha melhor versão. Estou a viver – finalmente e plenamente. Não para agradar, não para corresponder, mas para vibrar em sintonia com quem sou. E isso, para mim, é a definição mais pura de liberdade.