Peregrina – Cântico de Alma e Caminho

 Vou, de coração cheio, e com esperança vou,

Levando em silêncio o que o corpo não diz,

Entre vales de sombra e céus onde ecoou

A prece antiga que ainda me conduz.


Sou peregrina — de corpo, alma e essência,

Não de mapas ou passos apenas contados.

Caminho por fé, por busca, por ausência,

Por votos calados, por sonhos velados.


Antes de ir, abraço os meus filhos

Com a força de quem talvez não volte,

E nos seus olhos deixo abrigo,

Caso o destino me leve para longe, sem saber se volto.


Beijo o meu amor — meu companheiro,

Meu porto firme, meu chão sereno.

Levo no peito o toque derradeiro

De um amor inteiro, profundo e pleno.


Despeço-me, pois não sei se voltarei,

Mas vou inteira, na dor e na clareza,

Porque quem parte assim, como eu partirei,

Vai com fé viva e com a alma acesa.


A estrada é dura, sim — e bendita.

Refresca a alma, rasga o orgulho,

Mostra onde a força é infinita

E onde o medo se desfaz em entulho.


Cada bolha no pé é uma oração,

Cada cansaço, um espelho do ser.

E em cada passo mora a superação

De limites que nunca pensei vencer.


Fátima espera-me com véu de luar,

Como mãe que vela e consola a dor.

Lá deixarei o meu cansaço a chorar,

E no seu regaço hei-de achar amor.


Não vou por fugir — vou por buscar.

Vou por escutar um chamamento fundo

Que só quem ousa parar e caminhar

Pode ouvir nos silêncios do mundo.


Se não voltar, que fique este poema,

Semente de mim nos que cá deixo.

Mas se voltar, que traga o dilema

De quem se viu nua, no fundo do espelho.


Posso não regressar — mas vou inteira.

Na incerteza, levo a alma em flor,

Ofereço a Deus a vida inteira

E caminho com fé, dor e amor.



Nota: 

Escrevi o poema o ano passado. Decidi partilhar. 

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