Entre o Despertar e a Eternidade

 Há dias que não começam — simplesmente nos apanham no meio do cansaço, arrancando-nos da cama como se a alma ainda dormisse. Hoje foi um desses dias. Acordei tarde, num susto. O corpo ainda pregado ao colchão, como se tivesse adormecido num tempo paralelo. O relógio impiedoso marcava 8:00, e às 8:30 já deveria estar a caminho da Igreja de Nossa Senhora da Piedade.

Foi um arranque sem café, sem o ritual sagrado de preparar a marmita para o almoço partilhado — um gesto pequeno, mas carregado de significado. Na pressa, deixei para trás os hábitos e levei apenas o essencial: a vontade de cumprir a missão. Ainda assim, à hora marcada, entre batidas de coração aceleradas, entrei no carro. E partimos.

O destino era mais que um lugar físico — era uma experiência espiritual: a peregrinação até ao Cristo Rei. Chegámos e fomos recebidos por um mar de crianças, sorrisos e vozes juvenis que ecoavam alegria. Os escuteiros enchiam o espaço com jogos e cor, enquanto os vários movimentos da Igreja se entrelaçavam num mosaico vivo de fé e pertença.

Havia música no ar, comida que aquecia não só o corpo mas também o espírito, e convívio — esse bem precioso e cada vez mais raro — entre irmãos na fé. O terço, a adoração, os olhares serenos voltados para o horizonte onde o Cristo se ergue, de braços abertos, pareciam suspender o tempo. A paisagem à nossa frente, vasta e abençoada, era mais que vista — era sentida.

Agora, já em casa, com o corpo a pedir repouso e a alma a rever cada instante, preparo-me para mais uma reunião — desta vez, para a grande peregrinação a Fátima. Não sei se volto igual. Talvez volte transformada, talvez não volte. Ou talvez nem volte — porque há experiências que nos deixam lá, em paz, no silêncio onde a fé nos fala, o futuro a Deus pertence. 

Mas sei que vou. Vou com o coração pleno, com os olhos cheios de luz e a certeza de que a tranquilidade verdadeira não é gritada: é vivida. Em cada passo, em cada oração, em cada partilha. Vou porque há caminhos que não se percorrem com os pés — percorrem-se com a alma.

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