Segundo sim...

 Nunca pensei que me casaria duas vezes com o mesmo homem. Não que o matrimónio, no seu sentido mais literal, me tenha alguma vez parecido um objetivo inalcançável — mas também não era algo que eu perseguia como uma obrigação sagrada ou um ideal de vida. Quando me casei pela primeira vez, foi um acordo prático, uma união de vida e responsabilidades, selada pelo estado e pelos papéis burocráticos. Não estava nas nuvens nem imersa em promessas divinas; éramos nós, num ato simples, que simbolizava o afeto e a parceria que construímos juntos.

O curioso é que, ao contrário do que sempre imaginei, acabei por descobrir a fé. A fé que, confesso, observei com ceticismo na juventude, aquela mesma fé que muitos renegam, esquecem, ou simplesmente deixam para depois. Quem diria que eu, adulta já formada e com as ideias aparentemente resolvidas, um dia haveria de ser tocada de forma tão inesperada? Quem diria que, eu, sim eu, algum dia colocaria pés num caminho de peregrinação até Fátima, numa jornada mais interior do que física, carregando um peso simbólico muito maior que o dos quilómetros percorridos?

Sim, agora eu rezo. Não com um desejo de cumprir um ritual vazio, mas com um sentido que brota do peito, algo que acolhe as incertezas e abraça os medos com ternura. Fui percebendo, na beleza subtil da repetição, que existe uma força quase invisível no hábito de rezar, na persistência silenciosa de quem se abandona a algo maior. Neste processo de reencontro com a fé, de redescoberta das raízes e dos significados, o sacramento do matrimónio começou a ressoar de outra forma em mim. Não é que a nossa união, essa sim, nunca tenha sido sagrada. Pelo contrário, ela sempre foi, mesmo que não a chamássemos por esse nome. Contudo, agora há algo em mim que busca um vínculo maior, uma profundidade que transcende o pragmatismo do papel assinado.

Assim, encontrei-me a pensar na igreja, no casamento diante de Deus, esse passo que, antes, teria me feito rir, ou pelo menos levantar uma sobrancelha com um ceticismo um pouco sarcástico. Mas agora vejo o matrimónio não apenas como uma formalidade ou um ritual, mas como uma renovação do que temos, um compromisso sagrado de partilha, de respeito, de entrega. É como se tudo o que vivemos até aqui fosse um caminho até este momento, uma preparação silenciosa para uma promessa mais profunda, mais verdadeira, mais próxima do que sinto hoje em relação a nós e ao mundo que nos rodeia.

E, ironicamente, cá estou eu, prestes a dar o que poderia chamar de meu segundo "sim". Sim, à mesma pessoa, sim à mesma vida que partilhamos, mas agora com um sentido renovado, com uma fé que, com a mesma intensidade com que duvidei um dia, hoje me fortalece. E quem diria? Eu, que nunca pensei em ir a Fátima e muito menos me casar na igreja, agora vislumbro com serenidade o altar, o sacramento, e a bênção. Talvez, de certa forma, eu esteja a casar-me novamente com a vida, e talvez seja essa a mais profunda e bela renovação de todas.

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