Curioso.
Vivemos tempos curiosos, em que tudo é efémero e descartável, desde as informações que consumimos até as relações que cultivamos. Os encontros tornam-se fugazes, pautados pela pressa e superficialidade de um mundo saturado de conexões digitais, mas irremediavelmente carente de vínculos reais. Conquistar alguém para uma noite é tão fácil quanto deslizar o dedo numa tela de telemóvel, numa sucessão interminável de rostos e promessas vazias. No entanto, essa mesma facilidade, essa transitoriedade apressada, mina as possibilidades de uma ligação genuína. Difícil é amar alguém através dos anos, respeitando-lhe as falhas e abraçando-lhe as imperfeições.
Mas que ninguém se engane – esta superficialidade das relações não é apenas um apanágio dos jovens. A chamada “terceira idade” também se vê seduzida por esta velocidade e banalidade dos encontros contemporâneos. Casais que mal se conhecem agem como se fossem companheiros de uma vida inteira, mas sem a densidade ou a cumplicidade de quem realmente partilhou uma existência. Nesses encontros, quase tudo acontece, excepto aquilo que verdadeiramente importa: o amor, aquele que se constrói de forma lenta e paciente. Em vez disso, prevalecem relações onde o envolvimento físico é quase uma certeza e o afecto… uma incerteza, uma palavra perdida num passado distante.
E as amizades? Também elas parecem ter sido contaminadas por esse vírus da superficialidade. Falamos de “amigos” com uma ligeireza que desafia o próprio conceito de amizade. Passamos horas ao telefone, trocamos mensagens, enviamos fotografias, emojis e fragmentos do nosso quotidiano – mas quantos, de facto, nos conhecem? Quantos desses "amigos" são mais do que personagens cuidadosamente construídos, versões de nós próprios adaptadas à audiência do momento? Nestas interacções triviais, vestimos máscaras, interpretamos papéis, revelamos apenas o que convém. Criamos vínculos superficiais, fundados em cumplicidades que raramente ultrapassam o ecrã do telemóvel, navegando num oceano de ligações efémeras e quase fictícias.
Os termos modernos como “ficante” ou “peguete” bem revelam a fragilidade destas ligações. O “ficar”, que outrora podia simbolizar uma descoberta autêntica, tornou-se numa simples forma de entretenimento, uma troca onde nada se arrisca porque nada se entrega. E, para agravar a situação, há ainda os encontros virtuais, onde se dá uma suposta intimidade sem contacto, uma proximidade sem presença física – o “sexo virtual”, que parece caricaturar de forma perversa o desejo humano por conexão.
Vale a pena perguntar: o que estamos a perder com tudo isto? Vale a pena abrir mão do que poderia ser verdadeiro em troca do que é apenas imediato? As relações de hoje são construídas para durar o tempo de uma ligação à Internet, e interrogo-me sobre o que será de nós quando a ligação for interrompida.
A única conquista verdadeira é aquela que exige paciência, esforço, presença. Amores e amizades autênticos são raros precisamente porque se mantêm, porque sobrevivem às fricções e resistem ao tempo. Para persistirem, precisam de algo que transcende o toque imediato, algo que não se esgota numa curtida ou num deslizar de dedo. Precisam de substância, de profundidade – bens escassos neste nosso mundo moderno, onde tudo, ao que parece, tem o prazo de validade de um mero momento.