Momentos.
Há momentos em que o coração vê-se apanhado entre o passado e o presente, entre a memória de quem fomos e a realidade de quem tornámos-nos. Ao ler este poema, senti que era a minha voz, o meu pensamento, os meus próprios sentimentos inscritos em cada linha. É como se, na simplicidade das palavras, Robert Hershon tivesse descido às profundezas da minha alma e encontrado ali aquilo que nunca soube dizer em voz alta.
Recordo-me tão bem do tempo em que segurar a mão da minha filha era um gesto natural, automático, uma extensão do meu amor e do meu cuidado. Era eu quem a guiava pelo mundo, quem a protegia das quedas, dos carros que passavam, das incertezas do caminho. A mão dela, tão pequena, encaixava-se na minha como se tivesse sido desenhada para isso, e naquele simples toque parecia haver a promessa de que ela estaria sempre ali, pequena, dependente, minha.
Mas o tempo, ah, o tempo é um artista cruel. Transformou aquela menina numa mulher, alargou-lhe os horizontes, engrossou-lhe a voz interior e deu-lhe a força de quem já não precisa de quem a ampare. Agora, caminha ao meu lado como uma igual, ou talvez mais do que isso: como alguém que, por vezes, me olha com a mesma proteção que outrora era minha para com ela. Diz-me, meio divertida, meio incrédula: “Disseste mesmo isso?”. E naqueles olhos, que ainda consigo reconhecer como os da minha menina, percebo que ela já não é. Mas o meu coração? Esse não se importa com as mudanças. O meu coração não sabe esquecer quem ela foi.
Há alturas em que, sem me aperceber, o instinto ainda toma conta de mim. Quando caminhamos juntas, ao chegar à beira do passeio, sinto os meus dedos hesitarem, quase a procurarem a mão dela, como se, por um segundo, ela fosse outra vez aquela miúda de pernas curtas que confiava cegamente que eu a ajudaria a atravessar qualquer rua, qualquer obstáculo. E nesse instante, um misto de tristeza e ternura assola-me. Porque sei que ela já não precisa da minha mão. Mas, ainda assim, eu preciso de segurar a dela – nem que seja na memória, onde o tempo não tem autoridade para apagar o que o amor gravou.
Este poema é um espelho do que significa ser mãe. Ser mãe é viver num estado permanente de contradição: orgulhosa da independência que ela conquistou, mas saudosa da menina que dependia de mim. É perceber que a minha função era prepará-la para o mundo, e que, no entanto, isso significava ensiná-la a afastar-se de mim. É saber que o amor não diminui com a distância, nem com o passar dos anos; ele transforma-se em algo invisível, mas indestrutível.
Talvez o maior segredo da maternidade seja este: por mais que as nossas filhas cresçam, nunca deixaremos de as ver como as crianças que seguravam a nossa mão. E talvez, em noites mais tranquilas, enquanto dormem ou enquanto estão longe, a nossa alma ainda se estenda para as tocar, como um eco silencioso de tudo o que foi e de tudo o que será para sempre.