Entre Máscaras, Verdades e Sarcasmos:
Reflexão de uma Mulher Inteira
Há algo de sublime — e simultaneamente desconfortável — em conviver com quem não usa máscaras. Desconcertante, talvez, para os que se habituaram à hipocrisia social mascarada de polidez. Um verdadeiro privilégio, para os que, como eu, preferem a crueza da autenticidade à seda fingida da dissimulação. Conviver com seres autênticos, imperfeitos, pecadores, sinceros, humanos — inteiramente humanos — é respirar ar puro num mundo viciado em aparências. Gente que sangra, que falha, que ri alto, que chora quando ninguém vê, que tropeça na própria sombra e ainda assim continua, com dignidade, a sua marcha imperfeita. Gente que não se envergonha de ser gente.
Mas o melhor de tudo — e talvez a mais doce liberdade — é poder ser eu. Inteira. Com todas as minhas camadas, contradições, quedas e epifanias. Ser eu, com este sentido de humor que muitos não compreendem — sarcástico, por vezes negro, frequentemente ácido, sempre acutilante. Um humor que serve tanto como escudo como espada. Que denuncia, ironiza, provoca, mas também protege a minha sensibilidade de ser esmagada pela estupidez alheia.
Expresso-me como quero — ora assertiva, ora formal, ora de calão, sem necessidade de traduzir a minha essência em códigos que agradem a todos. Não preciso justificar o que visto, o que digo, quem sou ou que lugar ocupo nesta hierarquia social tão patética quanto ilusória. E não, não peço desculpa por ser livre. É um escândalo, eu sei.
Não me rodeio de inquisidores. Rodeio-me de cúmplices. Pessoas que não duvidam da minha palavra, dos meus valores, da minha intenção. Gente que não quer moldar-me, redimir-me, "melhorar-me". Não preciso de adestradores emocionais. Sabem que sou fiel até ao osso, generosa até à exaustão, intensa ao ponto de exaurir. Sabem que há em mim um coração que ama, mesmo quando parece inatingível, mesmo quando o sarcasmo é o primeiro idioma com que me apresento.
Não me proclamo perfeita — Deus me livre. Mas reclamo, com toda a altivez e humildade (sim, é possível coexistirem), o direito de ser complexa. Tenho dentro de mim uma alma que fervilha de criatividade, um espírito inquieto que vê o mundo através de prismas múltiplos. Analiso. Observo. E muitas vezes calo. Porque aprendi que há mais sabedoria no silêncio do que na tagarelice emocional que tanto polui as relações humanas.
Guardo segredos como quem guarda relíquias. E, sim, partilho pouco — não por frieza, mas por respeito. Porque sei que há conversas banais que ocupam demasiado espaço e eu prefiro silêncios carregados de significado. Mas quando falo, falo com intenção. Escuto com atenção. Valorizo a presença alheia com reverência, porque acredito — por mais ingénuo que pareça — que cada pessoa carrega um universo dentro de si.
Respeito. E sou respeitada. A base não é o medo, é a admiração mútua. Não preciso gritar para ser ouvida. A minha firmeza é tranquila, a minha autoridade, silenciosa. E mesmo quando pareço distante, é porque estou a digerir o mundo à minha maneira: em camadas, em códigos, em mil pensamentos simultâneos.
Sou mulher de fé. E a minha fé não é decorativa — não é um acessório de domingo. É visceral. É aquilo que me ancora quando o mundo tenta engolir-me. Tento que, ao olharem para mim, vejam Cristo — não num gesto messiânico, mas na forma como tento amar, servir, perdoar. Ainda que, por vezes, o meu sarcasmo se sobreponha à mansidão bíblica. Deus sabe, e eu sei, que ser cristã não é ser dócil até à estupidez. É ser forte, é ser íntegra, é ser capaz de se ajoelhar sem se rebaixar.
E não, não sou santa. Mas também não sou idiota. Sinto tudo — profundamente. Não finjo sensibilidade, não teatralizo empatia. Sofro em silêncio, amo com intensidade, perdoo com esforço. Detesto mentiras com uma aversão quase genética. E sim, sou ponderada. E sensata — agora, mais que nunca. A maturidade ensinou-me a diferença entre reagir e responder, entre tolerar e consentir, entre amar e anular-me.
Vivo num mundo interno tão vasto quanto silencioso. Uma mente inquieta, uma alma sensível, um olhar que analisa tudo — mas nem sempre comenta. Guardo o que sei, partilho o que pode edificar. Dou conselhos, ofereço ombros, amparo feridas. Acarinho sem sentimentalismos baratos. Amo sem me anular.
Sou uma mulher inteira. Que não precisa da aprovação dos demais para existir em paz. Uma mulher que caminha com Deus no coração, com ironia nos lábios e com fogo nos olhos. E se isso incomoda, talvez seja hora de os outros questionarem a própria superficialidade — não a minha intensidade.