Reflexão: Despedida.

 Falar em público sempre foi, para mim, uma prova de fogo. O simples ato de pronunciar palavras perante uma audiência faz-me sentir exposta, vulnerável, como se cada sílaba carregasse o peso de um julgamento iminente. O nervosismo instala-se, a respiração acelera, e o desconforto toma conta do meu corpo como um calafrio que não se dissipa. É uma batalha interna, onde a mente tenta convencer o coração de que não há perigo real, mas o corpo recusa-se a acreditar.

Curiosamente, esse desconforto assemelha-se à forma como muitas pessoas reagem ao falar sobre sexo. Há um constrangimento palpável, uma hesitação na escolha das palavras, uma tensão que se reflete no timbre da voz e na postura. No entanto, falar sobre sexo não tem, de modo algum, de ser brejeiro, baixo ou vulgar. A forma como abordamos qualquer tema depende da nossa intenção, do respeito com que tratamos as palavras e do significado que lhes atribuímos. O desconforto que algumas pessoas sentem ao discutir esse assunto advém, muitas vezes, de condicionamentos sociais, de uma educação que associou o tema a algo tabu, pecaminoso ou inapropriado. Mas as palavras são neutras até que lhes demos um tom, um propósito. A eloquência e a serenidade podem transformar qualquer conversa num diálogo respeitável, instrutivo e profundamente humano.

No meu caso, o desafio não está em falar sobre temas sensíveis, mas em falar em público. Ontem foi um desses momentos inesperados, uma situação onde o nervosismo ameaçou vencer, mas algo mais forte me impeliu a seguir em frente. Fui convidada a fazer uma leitura durante a Via Sacra. A pessoa que me pediu para o fazer encontrou a abordagem certa, a maneira perfeita de formular o convite. E eu, que tantas vezes encontro refúgio na palavra "não", simplesmente não a consegui utilizar. Havia algo de inevitável naquela aceitação. Talvez porque, no fundo, soubesse que precisava de viver esse momento, de testar os meus limites e desafiar o meu próprio medo.

Já tinha lido antes, mas sempre com a minha madrinha ao lado, um suporte que me dava segurança. Ontem, no entanto, senti-me sozinha perante aquele desafio. Mas, no fim, tudo correu bem. Senti-me atravessar um limiar invisível, um daqueles marcos que, por mais pequenos que possam parecer aos olhos do mundo, são imensos dentro de nós.

Há momentos na vida em que nos permitimos sair da nossa zona de conforto não por obrigação, mas porque sentimos que é o certo a fazer. E agora, sinto que estou a viver uma dessas fases. Sei que em breve partirei para um destino incerto, e essa incerteza traz consigo uma nova perspetiva sobre o presente. Não encaro esta despedida com tristeza, mas sim com a vontade de deixar algo para trás: memórias, gestos, momentos que perdurem no tempo. Pequenas marcas no coração das pessoas especiais que cruzaram o meu caminho. Se o futuro é incerto, então que o presente seja vivido com intensidade, com autenticidade, com a coragem de enfrentar os desafios, por mais assustadores que possam parecer.

Talvez, no fundo, seja isso que realmente importa: não a ausência do medo, mas a coragem de avançar apesar dele.


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