A Insubmissão Deliberada – O Manifesto da Voz que Não Se Cala

Há quem prefira o silêncio feminino: discreto, contido, quase ornamental. Querem-na calada, um leve sussurro, não vá a sua voz destoar do ambiente. É curioso observar como, ao longo dos séculos, se construiu uma narrativa onde a mulher ideal deveria ser quase invisível – magrinha, reservada, ponderada, comedida no verbo e no gesto. Uma presença tão leve que não incomode, tão maleável que se molde às expectativas alheias, tão suave que quase não ocupe espaço.

Mas há uma categoria de mulher que subverte essa expectativa com um sorriso no rosto e uma taça erguida no ar. Que prefere brindar à vida sem pedir licença, sem concessões. Que escolhe falar alto, rápido, com ideias demasiado grandes para serem sussurradas. Não para provocar gratuitamente, mas porque aprendeu, desde cedo, que engolir palavras corrói mais do que libertá-las. Ela não fala devagar para não entediar-se no ritmo dos que a querem domada.

O mundo gosta de tentar aparar-lhe as arestas. “E se fosses mais calada?” – dizem, como quem sugere um vestido mais neutro ou uma postura mais dócil. Mas ela entende que esse pedido carrega em si um veneno subtil: o desejo de contenção, o medo do excesso, da liberdade que não se encaixa. Queriam-na submissa, a caminho da cozinha, desempenhando papéis tradicionais que nunca pediu para representar. Mas ela é dona de si, do seu espaço, do seu kubiko – um território onde quem manda é ela, e onde cada canto ecoa autonomia.

Há, no entanto, uma faceta ainda mais perturbadora para os que a observam de fora: ela não busca aprovação. Não carece da validação alheia, nem se rende ao jogo das aparências. A mãe dele pode até não se dar com ela, as revistas podem passar ao lado, os amigos podem ir ficando pelo caminho – mas ela segue firme, porque aprendeu que perder quem não suporta a sua verdade é, afinal, um ganho. A sua rebeldia não é gratuita; é existencial.

Esta mulher, que muitos chamariam de "muita areia para a carripana", entende que não há glória em reduzir-se para caber em espaços apertados. Ela sabe que não precisa de ninguém, nem de nada, porque carrega dentro de si tudo o que lhe basta. Não é a roupa, o corpo ou a etiqueta social que a definem. É o verbo afiado, a alma indomável, a recusa de ser pequena para agradar.

E no fundo, a grande ironia é que ela é, simultaneamente, o problema e a solução: o problema para aqueles que não sabem lidar com a liberdade feminina; a solução para quem procura referências de força e autenticidade. Ela fala de política, de livros, de ideias vastas, porque não se limita ao trivial. Ela não quer ser um quadro na parede, mas a tempestade que movimenta o cenário inteiro.

Há uma beleza imensa, quase insolente, nessa mulher que balança a sair de casa, dona dos seus passos, sem precisar de amarras. Ela é, em si mesma, um manifesto vivo: a prova de que falar alto, rir alto, viver intensamente, é uma forma legítima e poderosa de existir.

Porque o que cansa, de facto, não é o barulho que ela faz, mas a tentativa constante de a silenciar.

Essa mulher sou eu. E sei que existem muitas.

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