O Corpo Não Mente
Sou um misto de transparência e caos. Um paradoxo ambulante, um livro aberto escrito a tinta invisível que só se revela sob a pressão de emoções fortes. O meu corpo não sabe mentir—o que sinto, manifesto; o que temo, tremo; o que amo, evito encarar de frente, porque olhar nos olhos de alguém que me importa quando tenho algo difícil para dizer é como tentar manter-me firme sobre um chão que se abre em fendas.
O síndrome vasovagal é o meu polígrafo biológico, um delator impiedoso que me expõe sem piedade. Não há máscaras, não há fingimentos. Se sofro, o meu corpo colapsa; se a raiva me toma, ou a contenho e desmaio ou a libero e destruo tudo num raio de metros emocionais. Não há meio-termo. Gostava de ser mais equilibrada, mais discreta nas minhas dores e júbilos, mas o meu sistema nervoso central tem outros planos para mim.
Hoje foi um dia curioso. Daqueles que são bons porque sim e maus porque o corpo decidiu que assim haveria de ser. Estive em paz, senti tranquilidade, falei de tudo e de nada—coisas essenciais e absolutamente irrelevantes, na perfeita harmonia de um dia comum. Mas as dores? Ah, essas! Cruéis, implacáveis, donas e senhoras do meu próprio corpo. A medicação? Um placebo glorificado. A minha mão esquerda inchada, um peso morto pendurado no meu corpo. Tentei levantar o braço e ele riu-se na minha cara, ou melhor, teria rido se tivesse vida própria, mas, como não tem, apenas se recusou a obedecer-me.
O voluntariado, esse gesto de altruísmo e dedicação, foi um exercício de resistência emocional. Não porque não quisesse estar ali, mas porque, em determinado momento, tudo em mim pedia para simplesmente largar tudo no chão e chorar como uma criança exausta. Custa a respirar. O esforço faz o meu coração bater como se estivesse a tentar fugir de dentro do meu peito. Mas ninguém tem culpa, pois não? Então sorrio e brinco, faço piadas, atiro-me para a vida como se fosse um espetáculo e eu, a palhaça de serviço.
A confiança, essa entidade frágil, é um bicho estranho na minha vida. Dás-me a tua, protejo-a como se fosse minha. Trais a minha? Não te confronto, não faço escândalos. Fujo. Sou um animal ferido que prefere desaparecer a dar a outra face. Porque sofrer uma vez já é um golpe suficiente—duas vezes seria um insulto à minha inteligência emocional.
Sou estranha? Sim, um pouco. Um manual de instruções mal traduzido, uma mistura de extremos, um ensaio clínico disfarçado de ser humano funcional. Mas ao menos sou genuína. E se isso significa tremer até cair, bem… Que assim seja. Sou autêntica, fiel e sincera e ainda por cima incapaz de dissimulação o que sinto vê-se. Seja o que Deus quiser!