A memória dos textos e a impermanência das palavras

Ao longo do tempo, as palavras que escrevemos moldam não apenas a percepção dos outros sobre nós, mas também a forma como nos vemos e compreendemos o mundo. No entanto, há momentos em que se impõe uma reflexão profunda sobre o que permanece e o que deve, inevitavelmente, ceder ao silêncio.

Foi com esse espírito de introspecção e rigor que analisei todos os textos que antecederam o dia 16 de março de 2022. Cada palavra, cada construção, cada ideia que ali se desenhava foi revisitada, relida com a distância do tempo e o olhar crítico que só a maturidade permite. O veredicto foi claro: esses textos não regressariam ao espaço público.

Não se tratou de um gesto impetuoso ou arbitrário, mas antes de um acto de consciência literária e intelectual. A escrita, como qualquer forma de expressão humana, é um organismo vivo, mutável, sujeito ao tempo e à evolução do pensamento. O que um dia foi um reflexo fiel da minha voz e do meu entendimento do mundo pode, hoje, já não me representar com a mesma precisão ou autenticidade.

Há uma certa melancolia nesse apagar, um reconhecimento da efemeridade inerente ao discurso escrito. Mas há também, e sobretudo, uma afirmação de liberdade. A escrita é uma construção contínua, um diálogo constante entre o que fomos, o que somos e o que aspiramos ser. Não há dever de imutabilidade, nem compromisso com versões passadas de nós mesmas que já não nos habitam.

Este processo, contudo, ainda não está concluído. A revisão estende-se agora aos textos publicados até ao ano de 2023 e, muito provavelmente, também esses serão retirados. A decisão não parte de um capricho ou de um desejo de ruptura, mas sim de uma exigência pessoal de coerência e autenticidade. Se a palavra escrita tem peso e significado, então deve ser cuidada com a seriedade que merece.

Alguns leitores poderão questionar a decisão, procurando nesses textos apagados vestígios de algo que lhes tenha sido significativo. Compreendo esse impulso, porque a literatura, seja ela qual for, pertence tanto a quem escreve como a quem lê. Mas a verdade é que a ausência também comunica, e há gestos silenciosos que são, por si só, afirmações eloquentes.

Que este acto não seja visto como uma negação do passado, mas antes como um testemunho da minha responsabilidade para com a palavra. O que permanece no blog, daqui em diante, será sempre fruto de uma escolha consciente, de uma escrita amadurecida pelo tempo e pela reflexão. Que cada texto, ao encontrar os seus leitores, se erga com a inteireza e a verdade que justificam a sua presença.

A escrita continua. E, nela, continuo eu.

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