Defeitos
Ora, não é que de repente, como por arte de mágica, descobriram em mim uma verdadeira lista de defeitos que até eu desconhecia? Já não me bastavam os que, modéstia à parte, são tão evidentes quanto o sol ao meio-dia, mas agora parece que alguém decidiu complementar o meu humilde inventário de imperfeições com mais uns quantos itens, saídos não sei de onde. Se calhar, no supermercado das imperfeições, fizeram uma promoção: leve dois defeitos reais e ganhe mais três imaginários de oferta! E não é que me saiu o bilhete premiado?
É que, ao que parece, olhar para mim causa um certo desconforto em algumas pessoas. Talvez seja porque, sem querer, personifico tudo aquilo que muitos desejam ser, mas não conseguem. Confesso que não deve ser fácil estar na minha pele, essa que parece ser um espelho que reflete as frustrações alheias, não é? Desculpem lá, mas a culpa não é minha se sou uma espécie de lembrança ambulante do que poderiam ter sido, mas não são. A natureza não me deu um escudo contra a inveja, o despeito e a amargura; deu-me, sim, um manual de instruções de como lidar com eles. Spoiler: é com muito sarcasmo e uma pitada de desprezo.
É curioso como, para algumas almas, o meu sucesso se transforma numa espécie de espinho encravado. Não interessa se suei a camisa, se chorei em silêncio, se lutei contra o mundo. O que importa mesmo é que estou aqui, de pé, e isso, meu Deus, é inadmissível! Ah, mas não vos preocupem, que eu compreendo: deve ser difícil ver alguém a fazer da vida uma piada enquanto ainda estão a tentar aprender o básico sobre como dar uma gargalhada genuína. Sabem, viver com leveza é uma arte, e eu devo ter nascido com o pincel na mão.
Mas vejam bem, aqui estou eu, a rir-me de tudo isto. E com gosto, diga-se. Porque no final do dia, o que realmente importa é que continuo o meu percurso, com todos os defeitos – reais e imaginários – que me atribuem. Porque sou a soma das minhas cicatrizes, sim, mas também do meu humor ácido e da minha língua afiada. E se isso incomoda alguém, a porta de saída está ali, logo à esquerda.
Agora, entre nós, eu sei que não sou perfeita – quem é? Mas o que seria da vida sem uma boa dose de defeitos para apimentar a existência? A perfeição é aborrecida, não acham? Eu cá prefiro continuar a ser este enigma, este mistério ambulante que, aparentemente, desafia as leis da física emocional. E, quer saber? Continuarei assim, sem pedir desculpas e sem explicar nada. Afinal, se me odiarem por ser quem sou, imaginem se soubessem tudo o que finjo não ser...