Intimidade com Deus além do domingo

A certa altura da minha caminhada, compreendi que Deus não me queria apenas aos domingos. Nem apenas na missa, nem somente quando o cântico termina ou quando a oração é pública. Deus quer-me inteira, todos os dias. E quer-me num lugar onde só Ele e eu existimos: o secreto. A intimidade. A entrega verdadeira.

Aprendi, com lágrimas e silêncio, que a fé que sobrevive ao tempo não é aquela que se vive apenas na liturgia, mas a que se respira entre as dores da segunda-feira, os cansaços da quarta-feira e os vazios da sexta-feira à noite. É ali, longe dos olhos dos outros, que se revela o que realmente tenho com Deus.

A minha fé não se mede pelos momentos em que participo de algo sagrado. Mede-se pela forma como ajo quando ninguém está a ver. Pela maneira como perdoo o imperdoável, como escolho calar quando queria gritar, como continuo a amar quando o coração quer endurecer.


Intimidade não se improvisa.

A intimidade com Deus é como um jardim: não floresce por acidente. Exige constância, silêncio, escuta e presença real. Não se trata de acumular práticas ou marcar presença. Trata-se de estar ali — corpo, alma e espírito — a escutar o Deus que fala mesmo no aparente silêncio.

Não é preciso palco. Nem ritual exagerado. Nem demonstrar fervor a quem está ao lado. Deus não precisa de espectáculo. Ele procura verdade. Reverência. Entrega. Um coração que O busque com sede e O adore em espírito e verdade — ainda que no fundo de uma dor, ou do cansaço, ou do desalento.


Além do domingo, existe o quotidiano — e é aí que Deus habita.

Sim, amo o domingo. Amo a liturgia, a Eucaristia, o cheiro do incenso, o som do órgão, o silêncio sagrado da adoração. Mas seria um escândalo espiritual se eu restringisse Deus apenas a isso. Deus não está só no templo: Ele está no trânsito, no lava-loiça, na fila do supermercado, nos silêncios do lar, nos telefonemas difíceis, nas palavras que escolho ou recuso dizer.

Deus está no momento em que escolho amar quando não me apetece.

Quando abro mão de ter razão para manter a paz.

Quando lavo os pés dos outros, mesmo com o orgulho a doer-me.

Foi aí que comecei a entender o verdadeiro significado de adoração: viver para Deus quando ninguém está a aplaudir.


Não preciso gritar para ser ouvida — preciso ser verdadeira para ser escutada.

A minha oração não precisa de volume. Precisa de profundidade.

Não precisa de dramatismo. Precisa de fé.

Aprendi a entrar no quarto, fechar a porta, e estar com Ele. Sem palavras bonitas. Sem disfarces. Só com a alma nua, o coração disponível e a certeza de que Deus não se impressiona com o que digo — mas move-se quando sou sincera.

Não há maior intimidade do que olhar para o céu e dizer:

Hoje, Deus, não tenho forças. Mas estou aqui.”

E descobrir que Ele responde:

“É precisamente aí que posso começar.”


Intimidade exige constância, não perfeição.

Há dias em que a oração flui como um rio. Outros em que é seca e árida. E mesmo assim, permaneço. Porque aprendi que amar a Deus não é sentir sempre o mesmo — é escolher estar com Ele, mesmo quando não sinto nada.

Fui criada para adorar com respeito e reverência, mas também para viver a fé na realidade.

E nessa realidade há filhos que não querem ir à missa, há amigos que se afastam, há momentos em que sou rejeitada, há mentiras que me magoaram e houve tempos em que quase perdi a esperança.

Mas Deus nunca me pediu perfeição. Pediu-me presença. E eu aprendi a permanecer — não apenas no domingo, mas todos os dias, com tudo o que sou e tudo o que tenho.


A mulher que vive com Deus fora da igreja é a que transforma o mundo dentro dela.

Sou mulher, casada desde a adolescência, pecadora, amada, forjada nas falhas e nas vitórias. Não sou líder religiosa — nem preciso sê-lo. Deus confiou-me o lar, o altar do quotidiano, o poder de transformar as pequenas coisas em eternidade.

Aprendi a caminhar com Deus de avental, de joelhos, com dores e com cânticos.

Aprendi a falar com Ele enquanto estendo roupa, enquanto rezo o terço no silêncio do meu coração, enquanto perdoo devagar quem me feriu.

E nesse caminho de cada dia, reencontrei-O não como uma ideia longínqua, mas como Aquele que respira comigo.


Conclusão

A fé que permanece é a fé vivida no secreto.

Hoje sei: se a minha fé não me acompanha além da missa, ela não é fé — é hábito.

Se o meu louvor não se traduz em actos, é apenas melodia.

Se a minha vida não reflecte o que proclamo, estou apenas a representar.

Mas se, além do domingo, continuo a amar, a lutar, a acreditar — então a minha fé está viva. E Deus, mesmo invisível, está comigo.

Porque a intimidade com Deus não 

é para ser visitada.

É para ser habitada.

Todos os dias.

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