Decepcionada com a Igreja: e agora?
(Na voz de uma mulher católica, madura, inteira, ferida e restaurada)
Não vou negar: houve dias em que quis partir.
Dias em que a decepção foi mais alta do que o canto do órgão.
Em que as palavras ouvidas dentro da igreja ecoaram como pedras — não como pão.
E questionei-me:
"Como é possível ser ferida no mesmo lugar onde esperava ser curada?"
Mas Deus... Deus permaneceu.
Fui ferida. Mas não fui abandonada.
A igreja — enquanto edifício físico, estrutura humana e espaço comunitário — não é imune ao erro.
Ela é santa pela presença de Cristo, mas é composta por homens e mulheres frágeis, muitas vezes perdidos no zelo, inseguros no poder, ou distraídos no serviço.
Fui ferida por pessoas que falavam de Deus, mas não agiam com Ele.
Fui julgada com frieza.
Apontaram-me o dedo por não ser como esperavam.
Tentaram calar a minha dor com frases feitas e versículos descontextualizados.
Vi sorrisos falsos, manipulações subtis e uma espiritualidade que mais parecia palco do que altar.
Mas também vi outros — silenciosos, fiéis, justos.
Vi uma religiosa de olhar firme e coração aberto.
Vi um sacerdote que confessava com lágrimas nos olhos.
Vi irmãs em Cristo que oravam sem alardes, que cuidavam sem propaganda, que amavam sem exigir.
Foi aí que percebi: a Igreja tem falhas — mas também tem milagres.
E os milagres não são sempre espetaculares.
São discretos, quotidianos, reais.
Não confundir Deus com os seus servos
Uma das maiores tentações quando nos decepcionamos com a Igreja é fazer de Deus o culpado.
Mas Deus não é o erro dos homens.
Não é a frieza da pastoral.
Não é a omissão da liderança.
Não é a vaidade disfarçada de zelo.
Não é a manipulação emocional, nem o abuso espiritual.
Deus é justiça e misericórdia.
É silêncio que cura, Palavra que ilumina, presença que restaura.
E se os seus servos falham — como todos falhamos — Ele não falha.
Ele continua a chamar-me.
Continua a esperar por mim.
Não para que eu finja que não doeu. Mas para que Lhe entregue a dor.
Sou Igreja — mesmo quando decepcionada
Sou mulher.
Sou católica.
E mesmo ferida, sou parte deste Corpo.
Não de forma cega, mas consciente.
Não por medo, mas por fé.
Ser Igreja não é concordar com tudo.
É amar o Corpo, mesmo quando ele está doente.
É saber onde denunciar e onde calar.
É saber quando sair de um espaço — e quando permanecer.
É discernir com o Espírito, não com a mágoa.
Não sou cúmplice do erro.
Mas também não sou traidora da fé.
Não vou desistir de Cristo porque Judas se sentou à mesa.
Entre a lucidez e a reverência
Continuo a entrar na igreja com reverência.
Não ajoelho perante as pessoas, mas diante do altar.
Sei quem é o centro. E não são os ministros, nem as estruturas, nem os microfones.
É Cristo. E Ele está ali.
Mesmo que o ambiente esteja seco, Ele continua vivo no sacrário.
Mesmo que o sermão me entristeça, Ele continua a falar no silêncio do meu coração.
Não quero uma fé ingénua, mas também não quero uma crítica destrutiva.
Quero uma espiritualidade madura. Que saiba dizer “sim” ao que é de Deus e “não” ao que se disfarça de sagrado mas fere a alma.
Não sou ingénua — sou firme
Vi manipulações espirituais.
Vi comunidades que usavam o nome de Deus para controlo, culpa e ego.
Vi líderes que preferiam obediência cega à escuta ativa.
Vi pressões disfarçadas de “amor fraterno”.
Vi o abuso do “vem com a tua família” como se fosse chantagem espiritual.
Mas também vi — e vivi — a cura.
O Espírito Santo não deixou que o erro dos outros apagasse a minha fé.
Fui tratada como alguém que devia calar, mas o Senhor ensinou-me a falar com sabedoria.
Fui excluída por não cumprir expectativas humanas, mas fui acolhida por Deus sem condições.
Conclusão: sigo com Cristo, na Igreja — mas com os olhos abertos
Sim, fui decepcionada.
Mas não fui vencida.
Não serei cúmplice do erro, nem vítima eterna.
Assumo a minha dor, mas escolho continuar.
Continuo a ser mulher de fé.
Com discernimento.
Com profundidade emocional.
Com fidelidade lúcida.
Sou Igreja.
Mesmo quando a Igreja me decepciona.
Porque sei que Jesus é o meu fundamento.
E que Ele, na sua infinita misericórdia, continua a renovar a sua Esposa — através de mim, através de ti, através de cada mulher que se recusa a endurecer o coração, mesmo quando tudo diz para fugir.