Escolas...

 Hoje, ao abrir o e-mail do blog, encontrei diversas mensagens recentes pedindo minha opinião sincera sobre mais um caso de violência numa escola. A cada novo relato, confirmo algo que há muito tempo já percebi: o problema não está apenas nos alunos que agridem ou nas vítimas que sofrem, mas sim no sistema que se recusa a lidar com a realidade. As escolas continuam a agir como se fossem fortalezas inquestionáveis, os pais oscilam entre a omissão e a indignação ineficaz, e a sociedade mantém um discurso vazio sobre a importância da educação sem realmente construir soluções. O que acontece entre os muros escolares é apenas o reflexo de um mundo que perdeu a capacidade de dialogar, de assumir responsabilidades e de, acima de tudo, proteger as crianças.

A realidade das escolas reflete a sociedade onde estão inseridas. O discurso sobre educação, respeito e empatia frequentemente esbarra na hipocrisia e na omissão. Pais culpam a escola, a escola culpa os pais ou as autarquias e no meio desse ciclo desgastante ficam as crianças, crescendo sem referências sólidas, sendo vítimas ou algozes de um sistema falho. Muitos pais, sem bases de educação cívica, descartam o papel educativo que deveriam exercer. Defendem os filhos cegamente ou, pior, os castigam sem oferecer compreensão. Já a escola – diretores, professores e funcionários – muitas vezes se colocam em um pedestal inquestionável, recusando-se a admitir falhas. Entre esses dois extremos, a comunicação, que deveria ser a ponte para soluções, é abandonada, tornando impossível qualquer avanço real.

A violência nas escolas não é um fenômeno isolado. É o reflexo de uma sociedade que normaliza a agressividade, a intolerância e a falta de diálogo. Cresci dentro desse sistema e sei, por experiência própria, que uma criança que pratica bullying não o faz simplesmente por maldade. Quando menina, agredi outras crianças, sem entender que, na verdade, estava a reagir ao meu próprio sofrimento. Não porque minha mãe não me amasse, mas porque ela não sabia o que fazer, e os recursos para lidar com essas situações eram inexistentes. A punição, severa e imediata, era a única resposta que recebia, intensificando o que eu já sentia: raiva, impotência, revolta. Ser espancada após cada chamada da escola nunca me ensinou nada além da certeza de que eu tinha que sobreviver sozinha.

Anos depois, quando me tornei mãe, quis fazer diferente. Substituí a violência pelo diálogo, pelo acompanhamento atento, pela vigilância silenciosa que equilibra amor e firmeza. Não queria que meus filhos passassem pelo que passei. Fiz de tudo para educá-los para a empatia, a compreensão e o respeito. Mas mesmo assim, foram vítimas de bullying. Foi quando senti, no mais profundo do meu ser, o peso da dor que os pais das crianças que agredi deviam ter sentido. Foi uma lição amarga, mas transformadora. Vi que não basta ensinar apenas dentro de casa. A escola, a comunidade e a sociedade inteira precisam caminhar juntas, algo que, infelizmente, parece ser um conceito abstrato e distante para muitos.

Em quase todas as escolas há crianças que praticam violência física ou verbal, e a primeira reação costuma ser apontar culpados. Mas gritar aos quatro ventos que "os pais não educam" ou que "a escola não faz nada" não resolve o problema. O que está por trás disso? Desigualdade social, lares desestruturados, falha nos modelos educacionais, falta de suporte psicológico, e principalmente, um ciclo de indiferença coletiva. Como sociedade, falhamos ao não criar redes de apoio efetivas, ao não educar para o respeito e a diversidade, ao fingir que as escolas podem resolver sozinhas problemas que exigem esforços muito mais amplos. No fim das contas, cada um segue preso em sua bolha, protegendo a sua verdade e descartando a necessidade de união.

O que mais me assusta não é a violência das crianças e jovens, mas a passividade com que tudo isso é tratado. As escolas hesitam em intervir, muitas vezes preferindo encobrir os problemas a enfrentá-los de frente. Muitos pais vivem de aparências, concordando com os professores apenas para, em casa, desautorizar suas decisões. E a sociedade como um todo prefere apenas apontar o dedo e reclamar. Queremos soluções, mas sem esforço. Queremos mudança, mas não saímos da inércia. Preferimos transformar as redes sociais em tribunais de condenação pública a ir para as ruas exigir melhores políticas de combate ao bullying, apoio psicológico adequado e mecanismos eficazes de mediação de conflitos.

O problema não está só na escola, nem só nos pais. Está no conjunto de uma sociedade que há muito tempo desaprendeu a dialogar, a agir coletivamente e a buscar soluções reais. Preferimos queimar tudo e começar de novo do que consertar as estruturas que já temos. Mas se não nos unirmos para resolver o que já está acontecendo, será impossível impedir o que está por vir.

Fui acusada injustamente e impedida de dialogar para resolver um mal-entendido que acabou por marcar o meu filho de uma forma que ainda não sei se está totalmente resolvida. Foi um episódio que expôs as falhas de um sistema que deveria proteger, orientar e educar, mas que, em vez disso, escolheu a punição cega e o silenciamento. Para mim, essa experiência não apenas deixou cicatrizes emocionais no meu filho, como também me transformou em uma antagonista declarada das instituições escolares. Não apenas da escola que ele frequentava, mas de todas, porque percebi que o problema não era um caso isolado, mas sim um padrão sistêmico de intransigência, arrogância e desumanidade.

A falta de diálogo não parte dos pais. Começa na própria instituição escolar, que prefere julgar e reprimir a escutar e entender. Em vez de resolver, acusam e abafam. Pais que não querem saber são ignorados sob o pretexto de que “não se preocupam”. Pais que exigem respostas concretas e soluções eficazes são rotulados como problemáticos, inconvenientes, alvos a serem neutralizados. O sistema fecha-se em si mesmo, acreditando que a sua autoridade não pode ser contestada, mas esquecendo que a verdadeira autoridade nasce do respeito e da confiança, e não do medo e da imposição.

As escolas possuem mecanismos para afastar os agressores das vítimas, mas não o fazem nem  de forma burocrática, as soluções são desprovidas de humanidade. No antigo agrupamento do meu filho, o agressor não apenas não era afastado, como era levado para dentro da sala sem ser aluno da turma, forçando meu filho a dividir o espaço com quem o fazia sentir-se vulnerável, quando questionei a senhora professora, fui acusada de descriminação, por defender meu filho. Não houve qualquer preocupação com o impacto emocional disso, com a humilhação silenciosa que meu filho carregava naquele momento. A mensagem que passou foi clara: o bem-estar da criança nunca foi a prioridade.

A frieza e a negligência demonstradas foram indignantes, adjetiváveis na pior das formas. O tratamento impessoal e insensível com que lidam com as crianças é de uma brutalidade que muitos não percebem, porque não se manifesta em tapas ou gritos, mas na indiferença calculada, no descaso institucionalizado, na burocracia desumanizante. Na escola, o aluno só importa se se encaixar perfeitamente no molde. Se fugir à norma, se precisar de atenção especial, se exigir mais do que os recursos disponíveis ou desafiar as falhas do sistema, então ele se torna um incómodo.

Foi assim que percebi que, na prática, teria de resolver tudo sozinha. E foi isso que fiz. Não esperei mais nada da escola. Nem apoio, nem soluções, nem sequer a mínima empatia. A escola tornou-se um obstáculo e não uma aliada, um espaço que deveria ser seguro, mas que se revelou hostil. Resolvi sozinha, e continuarei a resolver sozinha, porque vi na pele o que acontece quando confiamos demais em instituições que se esquivam de suas responsabilidades.

Mas há uma linha que jamais cruzarei. Enquanto eles julgaram e humilharam, a mim e meu filho sem pudor algum, eu jamais o exporia daquela maneira. Não o condenaria em praça pública, porque sei o que isso causa. A escola, que deveria dar o exemplo, não preservou o sigilo, não protegeu, não guiou. O que deveria ser um ambiente de crescimento e aprendizagem tornou-se um tribunal arbitrário, onde decisões são tomadas sem consideração pelo impacto emocional e humano que deixam para trás.

Meu filho tinha apenas 8 anos. E ainda se lembra, passou mais de um ano. Não deveria. Mas lembra-se bem. É essa marca que me revolta, que me acompanha, que me faz desconfiar de cada palavra saída da boca de um responsável escolar. E sei que muitos pais carregam essa mesma frustração, essa mesma impotência de ver um sistema falhar e, no fim, culpar aqueles que mais precisam dele.

As instituições escolares deveriam ser sinónimo de sigilo e ação, mas não sabem o que isso significa. No lugar disso, exibem descaso e burocracia, protegendo-se a si mesmas antes de protegerem os alunos. Fingem combater o bullying, fingem lidar com os problemas, mas apenas criam estatísticas manipuláveis para salvar a própria reputação. Não trabalham para prevenir. Não trabalham para curar. Trabalham para silenciar.

E o silêncio, muitas vezes, grita mais alto do que qualquer agressão.


Conclusão

Não estou aqui para julgar ou criticar, porque sei que, no fundo, todos falham – pais, professores, direções escolares, auxiliares e até a própria sociedade. Todos carregamos responsabilidades na forma como lidamos (ou deixamos de lidar) com a violência escolar e a falta de diálogo. Não há vilões absolutos, nem heróis imaculados, apenas pessoas que erram, algumas tentando acertar e outras sem saber como agir.

O agressor agiu por um motivo, e essa razão precisa ser compreendida. Os pais precisam olhar para si mesmos e perguntar: "O que posso mudar na forma como educo?" O pessoal docente e não docente deve refletir: "Como podemos lidar melhor com estas situações?" A autarquia precisa deixar de lado os discursos formais e partir para a ação real. Mas, acima de tudo, precisamos de vontade e de diálogo para chegarmos a soluções eficazes.

Nunca expus a escola, a professora ou a autarquia, porque nunca quis transformar o meu episódio pessoal em um instrumento de ataque. Minha intenção sempre foi buscar soluções, não alimentar divisões. Carreguei a minha parte da responsabilidade e acredito que, se cada um fizer o mesmo, poderemos construir um caminho mais justo e seguro para todas as crianças.

Deixo aqui as ideias e propostas para que sejam levadas a quem de direito. Cabe a nós decidir se queremos continuar a repetir os mesmos erros ou se, finalmente, estamos prontos para ouvir, dialogar e mudar.


30 Medidas Exequíveis para Combater o Bullying nas Escolas

O combate ao bullying não pode depender apenas de discursos e sensibilização. São necessárias ações concretas que promovam segurança, justiça e reabilitação para todos os envolvidos: vítimas, agressores, famílias e a própria comunidade escolar. Aqui estão 30 medidas eficazes e aplicáveis para transformar as escolas em espaços mais seguros e humanos.


1. Expulsão de Agressores em Casos Graves

Se um aluno apresentar um histórico contínuo de agressões físicas e psicológicas, sem mostrar sinais de mudança mesmo após medidas corretivas, a escola deve ter a autoridade para expulsá-lo, transferindo-o para um centro de educação alternativa ou escola com apoio especializado.


2. Trabalho Comunitário Como Medida Corretiva

Em casos menos graves, os alunos agressores devem ser obrigados a realizar serviços comunitários dentro da escola, como pequenas limpezas, arranjos de espaços comuns, organização de materiais e participação em atividades de ajuda aos colegas.


3. Vídeo Vigilância em Áreas Críticas

A instalação de câmeras de segurança nos corredores, pátios e refeitórios ajudaria a monitorar situações de conflito e impedir a impunidade de atos de violência.


4. Segurança Reforçada nas Escolas

Colocar seguranças pagos pela escola ou autarquia e incentivar um sistema de vigilância voluntária com profissionais treinados para intervir em situações de agressão. Mover os encarregados a participar a autarquia pode oferecer a formação e os encarregados participarem ativamente para patrulhar o recinto externo. 


5. Psicólogos Residentes e Terapia para Envolvidos

Toda escola deve ter pelo menos um psicólogo residente e oferecer terapia de grupo para vítimas e agressores, assim como acompanhamento dos pais para prevenir novos casos.


6. Mediação Escolar Profissional

Criar um sistema oficial de mediação de conflitos, com profissionais treinados para facilitar diálogos entre alunos, pais e professores, evitando agravamentos dos problemas.


7. Formação Obrigatória para Professores e Funcionários

Todos os professores, diretores e auxiliares devem receber formação contínua em gestão de conflitos, psicologia infantil e mediação escolar.


8. Presença Permanente de Assistente da Proteção de Menores

Uma profissional da proteção de menores deve acompanhar a rotina escolar para atuar de forma rápida sempre que uma criança apresentar sinais de vulnerabilidade.


9. Supervisão por Socióloga Escolar

Ter uma socióloga nas escolas ajudaria a compreender melhor as dinâmicas sociais que favorecem o bullying, propondo estratégias preventivas eficazes.


10. Código de Conduta com Punições Claras

Cada aluno e sua família devem assinar um documento onde constam regras claras sobre comportamentos inadequados e as consequências para cada infração.


11. Criação de Círculos Restaurativos

Método que reúne vítima e agressor para um diálogo guiado, com um mediador, permitindo que o agressor compreenda o impacto do seu ato e busque uma reparação justa.


12. Suspensões com Trabalho Educativo

Em vez de suspensões tradicionais, os alunos devem realizar trabalhos pedagógicos ou comunitários, como participar de campanhas contra o bullying ou ajudar na biblioteca.


13. Programa de Mentoria Entre Alunos

Criar um sistema de padrinhos e madrinhas, onde alunos mais velhos ajudam a acompanhar e proteger os mais novos, criando uma rede de suporte dentro da própria escola.


14. Palestras com Vítimas e Ex-Agresssores

Realizar encontros com pessoas que sofreram ou praticaram bullying no passado para compartilhar suas experiências e evitar que a história se repita.


15. Linha Direta de Denúncia Segura

Implementar um canal anônimo de denúncia, online e físico, onde alunos possam relatar casos de violência sem medo de represálias.


16. Tutores Externos para Apoiar Crianças Vulneráveis

Criar parcerias com organizações para oferecer mentoria e acompanhamento para alunos vítimas de bullying, garantindo um suporte mais amplo.


17. Fiscalização Escolar com Encarregado de Educação Voluntário

As inspeções escolares da Direção-Geral de Educação (DGE) devem ser acompanhadas por um voluntário encarregado de educação, garantindo maior transparência.


18. Intervenção Direta da Autarquia

As câmaras municipais devem atuar de forma ativa financiando programas anti-bullying e acompanhando a segurança e bem-estar das crianças nas escolas.


19. Proibição de Aparelhos Eletrônicos Durante as Aulas

O bullying muitas vezes ocorre pelo uso inadequado de telemóveis e redes sociais. Limitar o uso desses dispositivos dentro das salas pode reduzir conflitos e cyberbullying.


20. Atividades Lúdicas para Construção de Empatia

Criar dinâmicas onde alunos pratiquem a empatia na prática, como exercícios onde precisam se colocar no lugar do outro e encenar diferentes papéis sociais.


21. Rondas Ativas de Professores e Auxiliares nos Intervalos

Professores e funcionários devem estar presentes e atentos nos corredores e pátios, intervindo antes que as agressões aconteçam.


22. Programa de Monitorização do Bem-Estar Escolar

Realizar questionários periódicos para avaliar o nível de segurança emocional dos alunos e fazer intervenções personalizadas.


23. Política de Tolerância Zero Aplicável a Todos

Criar um protocolo para punir de forma proporcional e justa todos os casos de bullying, sem favoritismos.


24. Sensibilização das Famílias Sobre Responsabilidades

Promover formações obrigatórias para os pais dos agressores e vítimas sobre o papel das famílias na prevenção e combate ao bullying.


25. Psicopedagogia para Reintegração de Agressores

Antes de retornar às atividades normais, um aluno agressor deve passar por um plano psicopedagógico com especialistas.


26. Sala de Escuta Ativa para Vítimas

Criar um espaço seguro dentro da escola para as vítimas falarem sobre o que estão passando, com o acompanhamento de profissionais.


27. Monitoramento da Situação Após Cada Caso de Bullying

Toda vítima e agressor devem ter um acompanhamento mínimo de seis meses para garantir que o problema não se repita.


28. Programas de Sensibilização para Todas as Turmas

Tornar obrigatórias ações educativas contínuas sobre os danos causados pelo bullying e a importância da empatia.


29. Registo Escolar de Infrações

Criar um banco de dados para registrar casos de bullying e a reincidência de alunos problemáticos.


30. Maior Articulação Entre Escola, Polícia e Proteção de Menores

Casos graves devem ser comunicados imediatamente às autoridades responsáveis, garantindo a proteção da vítima e a reabilitação do agressor.


Conclusão:

Ação Conjunta Para um Problema Comum

O bullying não é um problema sem solução, mas exige compromisso de todos: alunos, pais, professores, diretores, auxiliares, autarquia e até a própria comunidade. Medidas isoladas não bastam – é necessário um sistema completo de prevenção, intervenção e reabilitação.

O diálogo pode e deve existir, mas precisa ser acompanhado de ações concretas. Se cada um assumir a sua parte na responsabilidade, será possível construir uma escola segura para todas as crianças. A mudança começa com a vontade de agir.

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